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Um mundo de peixinhos dourados.
Há alguns anos, em seu livro “Fora de Série”, o escritor Malcolm Gladwell
popularizou a ideia de que, para se tornar especialista em qualquer área do
conhecimento, bastava dedicar 10 mil horas de prática ao ofício. De lá para
cá, esse número mágico foi muito questionado: alguns disseram que era
preciso mais tempo do que isso, outros que menos já seria suficiente, e
ainda havia aqueles defensores da ideia de que não é possível estabelecer
um valor desses, uma vez que cada campo e cada pessoa teriam suas
particularidades.
Não, não fiz uma pesquisa para trazer a vocês o número definitivo. Se era
isso o que estavam esperando, já peço desculpas. A reflexão que proponho
é a seguinte: no mundo atual, teremos cada vez menos e menos
especialistas, craques ou gênios da forma como os conhecíamos até hoje.
Isso porque, como Gladwell escreveu, chegar ao topo não exige apenas
talento. Exige dedicação. Disciplina. Rotina. Ninguém se torna líder ou
referência em algo simplesmente decidindo sê-lo da noite para o dia. Não
há alternativa a não ser estudar, praticar, repetir, praticar, estudar, repetir.
Mas, se há algo em comum entre um atleta vitorioso como Michael Jordan e
um escritor prolífico como Stephen King, entre um músico virtuoso como Eric
Clapton e um cientista inovador como Isaac Newton, é isso: uma entrega
profunda ao seu ofício e à sua arte, a tal ponto que, para os outros, tudo o
que realizaram parece vir fácil.
Infelizmente, no mundo em que vivemos hoje, vemos e veremos cada vez
menos disso. Vivemos em uma época curiosa, na qual o acesso fácil e
rápido a tudo e a qualquer informação nos tornou distraídos. Sabemos de
tudo um pouco, mas muito sobre nada. Não temos – nós e as gerações
mais recentes - paciência para nos aprofundar em algo. Tudo deve ser
rápido, imediato, resumido. Um estudo recente realizado no Canadá
mostrou que, atualmente, as pessoas têm capacidade de atenção menor
que a de um peixinho dourado: enquanto a média de foco dos fofinhos
nadadores de aquário chega a nove segundos, a nossa não passa de oito.
Há poucos meses, participei do RD Summit, em São Paulo, um dos maiores
eventos de comunicação, vendas e tecnologia do país. Lá, o tema da
constância e da repetição foi um dos mais citados, em diferentes formas.
Um palestrante, por exemplo, disse que, nas redes sociais, é a frequência
que traz resultados. Outro, por sua vez, destacou a importância das marcas
manterem uma consistência visual em sua comunicação, pois isso pode
aumentar em até 23% o recall.
Uma das palestras mais interessantes e concorridas do RD Summit foi a de
Dafna Blaschkauer, executiva que ocupou papéis de liderança em negócios
pequenos de esquina como Apple, Microsoft e Nike. Seu painel foi
exatamente sobre o que falo neste texto: sobre repetição, sobre disciplina,
sobre método. Algumas de suas frases poderiam ser impressas e colocadas
na parede de casa como lembretes diários do que é preciso fazer se
queremos nos diferenciar da multidão ou até mesmo atingir objetivos
menores, como até mesmo perder alguns quilinhos:
- “Não basta ter método. Tem que ter meta.”
- “Não é o talento que diferencia vencedores de perdedores. É a disciplina.”
- “Disciplina é você fazer o que tem que fazer mesmo quando não tem
vontade de fazer.”
- “A disciplina vence o talento quando o talento não tem disciplina.”
- “A chave para dominar um novo hábito é a repetição, não a perfeição.”
Não há milagre. Não há segredo – ou melhor, este é o segredo. Se você
pretende se destacar em um campo de atuação, se objetiva se tornar
especialista em algo, se almeja ser um virtuoso em determinada arte,
mergulhe naquilo, estude com afinco, pratique com disciplina. Acima de
tudo, repita. E depois repita mais centenas ou milhares de vezes.
Pode parecer monótono – e, por muito tempo, realmente vai ser. Mas é isso
que trará os resultados desejados.
E, em um mundo de peixinhos dourados, esse será seu grande diferencial.